VIDAS FUGAZES
Há
escritores que parecem, encarados a partir dos dias de hoje, ter passado
clandestinos pela escrita, mas que têm o condão de transformar em magia tudo o
que tocam. O leitor, que os descobre, cria o hábito e o gosto de os guardar no
seu guarda-jóias como se fossem o seu mais precioso património, Um destes
casos, para muitos leitores (é o caso de André Breton, grande especialista na
descoberta destas preciosidades), é o de Marcel Schwob.
Este
homem, no seu frenesim de conhecer, dedicou-se um pouco a tudo, conseguindo
quase sempre atingir um grau original de reflexão e dificilmente classificável
nas categorias do seu tempo. Estava-se no final do século passado e esta avidez
diletante era bem vista e apreciada. Porém, é inegável que a sua atitude
contribuiu de forma significativa para diversificar os gostos estéticos numa
França que, do alto do seu pedestal cultural, tem sempre tendência para se
isolar.
Em boa
hora, a Teorema resolveu traduzir e editar um dos livros mais fascinantes deste
autor: trata-se de Vidas Imaginárias, um conjunto de biografias ficcionadas de
personagens reais, míticas e inventadas.
Como o
próprio autor explícita no prefácio desta obra, estas breves “vidas”
apresentam-se como entidades únicas, onde cada gesto, sinal físico, afecto ou
emoção tem um valor simbólico obscuro, perturbante, que nos obriga a questionar
sobre o sentido do universal. Nada fica explicado ou esclarecido sobre estas
vidas; pelo contrário, grande parte da vertigem que se tem ao ler estas
pequenas histórias advém das perguntas que elas nos obrigam a formular: que
sentido tem cada existência? Que quer dizer o termo “vida”, quando encaramos
este formigueiro de seres, de partículas, que o tempo continuamente devora?
Esta
edição refere na contra-capa que este tipo de biografias teve um excelente
continuador em Jorge Luís Borges. É certo; no entanto, a preciosidade
fantasista destas fugazes “vidas” dá-nos hoje a ilusão de que foram escritas a
duas mãos: uma delas enluvada por Yourcenar, outra por Pieyre de Mandiargues.
Publicado no Público em 1990.
Título: Vidas Imaginárias
Autor: Marcel Schwob
Tradução: Telma Costa
Editor: Teorema
Ano: 1990
141 págs., esg.
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